2020
MAS DO NADA QUE HOJE SOU
Este é o silêncio
Onde me recolho e sinto só
Este é o tempo parado por sí só
Este és tu e eu, e nada mais
Vozes soltas, medo e espera
Este é o mês da liberdade
Este és tu na primavera
Nasci e vou morrendo devagar
Mas do nada que hoje sou
Apenas tu eu a navegar
Ai sonho triste e demorado
Ai pranto meu amargurado
Quando Abril nasceu foi desejado
Queimado, mas vivo e forte
É muito amado.
Texto: Paulo Valentim
19 de Abril de 2020
RES IMMOBILES
Sonho inquieto – a cidade-fantasma
Pó. Arbustos secos giratórios numa estrada ladeada por casas decrépitas. As portas caem dos gonzos, a todas as placas faltam letras e nelas morre, desconsolada, a cor. A intensidade da luz não permite olhos abertos. Semicerrados, doem-me.
Nem vivalma. Bebedouros estéreis de canos enferrujados. Vazios. Inúteis. Desistentes.
Desexistentes.
Lisboa, abril de 2020
Imagens de desolação em chiaroscuro
Do mundo, maior do que eu, só capto pormenores: o mar revolto, a linguagem das nuvens, um olhar triste-absorto. O escuro ameaça essa luz que teima, sem sentido, nas casas, entre as folhas de cada planta do vaso, de todos os canteiros.
E Liberdade em abril? De quem? Para quê?
Porquê?
A segurança de uma máscara que cobre o rosto e esconde a dignidade de quem espera. Luvas angustiadas de mãos limpas buscam o vazio.
Sem cor, de viés, há olhares que nos trespassam em corpos que involuem.
Ele, poeta, em negro fala-nos da luz. De olhos bem abertos.
Tremi.
Texto: Nuno Verdial Soares